A história de um castigo “leonino” e do seu perdão (1936)
Rubrica 100 Anos em 100 Dias
06 setembro 2024
Centenário
A 21 de agosto de 1936 surge, pela primeira vez e devidamente registada em ata, a nova grafia para Associação de Futebol de Santarém, caindo de vez a expressão inglesa de “Foot-Ball”, usada até aí (embora, paradoxalmente, ela permaneça ainda por largos anos grafada nos Estatutos da Associação, até à sua primeira revisão em 1986).
Esta Assembleia Geral de 21 de agosto, tem como ponto único a eleição dos corpos gerentes para a época de 1936-1937, que ficaram assim constituídos: presidente da assembleia geral, Carlos Marques; vice, Augusto José da Silva; secretários, Ricardo Mariano Júnior (G.F.E. Comércio) e José Ferreira (S.G. União Operária).
Direção: presidente, Eng.º Manuel Barata G. Graça (S.G.S “Os Leões”); vice, Eng.º Luís Filipe dos Santos (A. Académica); secretários, Eurico Correia (Sporting C. de Tomar) e Francisco Valente; tesoureiro, António Mendes (U.F. do Entroncamento); vogais, José Ferreira de Azevedo (A. Académica) e António Bernardo da Silva Pereira. Conselho fiscal: José Pereira da Guia, Alberto Ferreira Baptista e Duarte José Carvalho da Costa (G.D. do Cartaxo).
A gerência desta Associação de Futebol duraria pouco, meio ano penas. A 28 de dezembro de 1936, numa atribulada reunião da Assembleia geral, cai com estrondo a Direção. Mas vamos à história, que tem o seu quê de picaresco.
A reunião, de caráter extraordinário, é convocada por vários clubes a pretexto da “apreciação do protesto apresentado pelo União Operária sobre o jogo com a Académica”; mas trazia escondido, por debaixo da mesa, assunto bem mais espinhoso: o severo castigo imposto pela Direção da Associação ao Sport Grupo Scalabitano “Os Leões”, uma invulgar suspensão por seis meses de participação nos campeonatos, o que à época era quase uma sentença de morte ao clube.
As primeiras palavras do presidente da Assembleia Geral; Carlos Marques, foram para divulgar os nomes dos 9 clubes que haviam convocado a reunião extraordinária, a saber: “Os Leões, Grupo Desportivo do Cartaxo, Empregados do Comércio, Sporting de Tomar, União de Tomar, União F. Entroncamento, Ribatejano F:C: Valadense, S:C: Coruchense, União Operária e um grupo de 8 sócios individuais. A estes, somava-se ainda a presença de mais 7clubes: Sport Lisboa e Santarém, Associação Académica, Grupo Desportivo da Casa do Povo, União de Almeirim, 11 Unidos do Entroncamento, F.C. Salvaterrense e Tramagal Sport União.
Como se vê uma concorridíssima reunião. E começou logo mal, com uma atrabiliária atitude da Direção da Associação, ao apresentar um requerimento à mesa a reclamar a suspensão da referida reunião por a considerar ilegal; e para tanto citou um parecer do douto advogado Artur Proença Duarte (uma eminente figura de Santarém, deputado da Nação e fervoroso apoiante de Salazar – por ironia do destino, vira a morrer exatamente no mesmo dia do ditador).
Depois de muita discussão, o presidente da mesa declarou que a reunião continuava e que “a sua resolução era soberana”. E passada a palavra aos sócios, Francisco Gaspar, delegado do Coruchense, apresentou uma proposta para levantamento do castigo de seis meses de suspensão imposto ao Grupo Scalabianto “Os Leões”. A proposta (que reproduzimos na foto), seria aprovada por 69 votos a favor e 16 contra.
De imediato, o presidente da Direção, Manuel Barata Graça, sentindo-se desrespeitado, pede a palavra para apresentar o pedido de demissão coletiva da Direção da Associação; o que é aceite, sem rebuço, pela mesa.
Passa-se então a apreciar o pedido do União Operária, de anulação do jogo com a Académica, realizado a 6 de dezembro, por alegadas irregularidades, de acordo com o relatório do árbitro. Após breve discussão, o caso é colocado à votação, sendo aprovada a anulação do jogo por 35 votos contra 34, tendo-se alguns clubes e sócios abstido de votar. Pesaroso com a decisão, o delegado da Académica, José Amaral, declara que o seu clube vai recorrer para a Federação.
É então que o delegado do Sporting de Tomar desabafa: “a Assembleia Geral foi convocada mais pela influência d’ “Os Leões” do que pela do Operário, que apenas serviram para fazer o frete aos Leões”.